INARA – capítulo 5 – Fiori Gigliotti e Roberto Carlos

Inara tinha uma vida movimentada por eventos incomuns para a época e local.
Seus pais eram bastante ativos na sociedade angatubense. Havia muitos eventos festivos e comemorações de datas importantes para a cidade. Um deles marcou a infância de Inara. Nessa ocasião seu pai era o presidente do clube.
Fiori Gigliotti, o mais famoso radialista esportivo da época no Brasil, era um apaixonado por futebol. Ele tinha programas na rádio e na TV Bandeirantes. Fiori e os colegas de trabalho formaram um grupo chamado “Scratch do Rádio”. Eles viajavam aos finais de semana para cidades do interior de São Paulo, a fim de jogar futebol contra os times de veteranos locais.
Havia grande festa para recepcioná-lo e aos colegas da rádio e da TV, que compunham o time de futebol. Eles não cobravam por isso, faziam pelo amor ao esporte e consequentemente ajudavam a instituição beneficente da cidade.
Os pais de Inara entraram em contato com Fiori Gigliotti para planejar a visita do Scratch do Rádio para celebrar o aniversário da cidade.
Marcaram a data. Muitos planos e preparativos para a festa: faixas de boas-vindas para distribuir pelas ruas da cidade, acomodações para os jogadores, comes e bebes para recepção após o jogo, os fogos de artifício, etc.
Tudo transcorria conforme o planejado, porém na véspera do grande dia, o pai de Inara sofreu um acidente. Ele estava numa escada, amarrando a última faixa num poste, quando escorregou, perdeu o equilíbrio e caiu lá do alto, torcendo o tornozelo.
Inara assistiu à queda, correu para perto dele, mas não conseguiu vê-lo. Os amigos estavam a sua volta tentando ajudá-lo. Ela, empurrando todos, passou por baixo das pernas de um deles e chegou até o pai. Abraçou-o chorando. Os amigos o levaram ao hospital e o pé foi engessado.
No dia seguinte, Fiori Gigliotti e seu time estavam no centro do gramado, aguardando a entrada do anfitrião da festa, para as formalidades antes do início da partida. O pai de Inara caminhava devagar, apoiado em duas muletas e Inara ao seu lado, carregando a bola de futebol. Todos olhavam para eles.
O pai era um dos melhores jogadores do time e a promessa para vencer o jogo daquele dia. Mas, a única coisa que poderia fazer naquele instante, seria participar das homenagens.
Fiori fez o primeiro discurso.
Ele era um poeta, tinha o dom de usar as palavras de maneira que tocava os corações sensíveis. Agradeceu ao pai de Inara pela iniciativa e todo o empenho para a realização daquele evento. Falou da tristeza em não poder tê-lo como adversário dizendo que qualquer que fosse o resultado do jogo, para ele não teria mais o mesmo valor. Todos ficaram tocados pelas palavras e Inara viu pela primeira vez seu pai chorar.
Ela usava um vestidinho amarelo com a gola branca bordada à mão, meia soquete branca e sapatinho de verniz preto. Estava bonitinha e muito feminina, sentia-se bem. Ela daria o pontapé inicial da partida. Ali estavam vinte e dois jogadores, o prefeito da cidade, outras autoridades e seu pai. Inara pensou: “Como queria ver meu pai disputando esta partida. Mas por que eu dar o chute inicial? Deveriam ter escolhido um menino para fazer isto. Bem, se meu pai me escolheu e isso o faz feliz, eu também fico”.
“Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo!” Era assim que Fiori Gigliotti iniciava a narrativa dos jogos.
Ele, a esposa e o filho, ficaram hospedados na casa de Inara. Fiori, estava habituado a se hospedar na casa dos anfitriões das cidades que o recebia. Apesar de ser famoso, era um homem simples, sensível e muito querido por todos.
Após o jogo e celebrações daquele dia, Fiori e a esposa conversavam animadamente com os pais de Inara antes de prepararem-se para dormir. Fiori descobriu algo em comum com o pai dela. Além da paixão pelo futebol, eles também amavam pescar.
Nasceu ali, uma grande amizade entre as famílias.
O pai de Inara contou sobre os lugares especiais próximos à cidade, como sítios e fazendas de amigos, que eram muito bem preparados para uma boa pesca. Esses lugares tinham os tablados de madeira, à beira do rio, para sentarem-se confortavelmente. Também haviam cevas, que eram cestos com comida, amarrados sob os tablados, para atraírem mais peixes. Portanto, a pescaria era sempre farta.
Combinaram que Fiori voltaria a Angatuba, desta vez para pescar.
E ele voltava sempre que podia. Às vezes sozinho e outras com a família.
O radialista adorava o jeito simples como era recebido. Ao final do dia da pesca, reuniam-se para jantar e os peixes trazidos compunham o cardápio.
Ali ele contava histórias que animava os amigos e convidados daquela noite. No dia seguinte pela manhã, ele retornava a São Paulo.
Quando Fiori trazia a esposa e o filho, as mulheres passeavam pela cidade, enquanto Inara acompanhava o pai na pescaria. Ela sabia pescar, aprendeu com ele. Gostava do silêncio que todos tinham de fazer sentados à beira do rio. O barulho espantava os peixes.
Em um desses dias, com apenas o cantar dos pássaros e o ruído das folhas das árvores, Fiori, sentado ao lado dela e do pai, disse baixinho.
– Sabe aquele cantor famoso, chamado Roberto Carlos?
– Sim. – o pai respondeu.
Inara arregala os olhos e abre bem os ouvidos. Quem não conhecia Roberto Carlos? Ela era fã dele, tinha comprado recentemente seu último disco.
Fiori continuou:
– Pois é, somos amigos e ele também gosta de pescar. Comentei com ele sobre estes recantos pitorescos e confortáveis para por aqui e ele sentiu vontade de conhecer.
Inara quase caiu na água pelo susto. Chegou ainda mais pertinho do pai para não perder nenhuma palavra. Nisso, um peixe fisgou o anzol dela e chamou a atenção do seu pai e de Fiori. Ela precisou de ajuda para tirar o peixe da água. Contrariada, pensou: “mas bem agora, no meio da conversa que esse peixe resolve aparecer?” Disfarçou a contrariedade e rapidamente retornou ao local onde estavam sentados, na esperança de que eles retomassem o assunto.
Fiori continuou:
– Ele também gostou de saber que por ser uma cidade pequena, sem hotel, poderia ficar hospedado em casa de família e assim, anônimo. Não queria que ninguém soubesse que estaria na cidade.
O pai de Inara imediatamente disse sim, quando ele quisesse. Só precisava saber com antecedência para preparar tudo para receber uma pessoa tão importante.
– Quem sabe deveriam hospedá-lo numa casa maior e mais confortável? disse o pai. Fiori o interrompeu:
– Ele vai gostar de ser recebido como eu sou, como um amigo, em sua casa, se assim você desejar. Lembre-se de que ele não quer que a notícia se espalhe. Ele virá no final do dia. Pela manhã, vamos à pescaria e só voltamos à noitinha para tomar banho e dormir, seguindo viagem no outro dia bem cedo.
Inara não acreditava no que estava ouvindo. A conversa em sua cabeça produzia um ruído tão forte, que se os peixes pudessem ouví-lo, fugiriam para bem distante.
Não poderia contar a ninguém, e se contasse, talvez não acreditassem.
Na volta para a casa, no banco de trás do carro, ela ficou sonhando acordada imaginando Roberto Carlos, hospedado em sua casa.
E ela sonhou de verdade, várias noites, à espera da data que seria agendada para a vinda do famoso cantor. Sonhou com Roberto Carlos sentado à mesa do jantar, conversando descontraidamente como sempre acontecia com Fiori Gigliotti. Via-o também no sofá da sala, com o violão nos braços tocando só para eles. Quando acordava, percebia que tinha sonhado com algo que poderia acontecer em breve.
A data foi marcada! A felicidade e a ansiedade eram parceiras de Inara diariamente.
Dias depois, após o jantar, toca o telefone e o pai atende. Era Fiori Gigliotti. Pelo semblante do pai, ela percebeu que não era uma boa notícia. Ao desligar, ele disse:
– Roberto Carlos precisou adiar os planos de sua vinda para Angatuba, por compromissos de trabalho. Fiori nos avisará a próxima data.
A mãe de Inara ficou triste e aliviada ao mesmo tempo, pois se preocupava em receber bem duas celebridades ao mesmo tempo em sua casa.
Inara ficou desolada, muito triste pensando que talvez ele não viesse. Rapidamente reagiu dizendo a si mesma:
– “Nāo tem importância, se ele não vier um dia hei de conhecê-lo pessoalmente e lembra-lo de que quase foi hóspede em minha casa por um final de semana.“
Anos depois, ela foi assistir a um show do Roberto Carlos em São Paulo e ao final, pediu para cumprimentar o artista no camarim. Ela estava com alguém que conhecia a mãe do cantor, o que facilitou o acesso aos bastidores.
Esperou sua vez numa pequena fila. Ao chegar perto dele e estender a mão para cumprimentá-lo, comentou que era de Angatuba e ele não demonstrou reação alguma. Aí, lembrou-o sobre o plano da pescaria com Fiori Gigliotti e que seriam hóspedes em sua casa.
Ele sorriu, deu um beijo na face de Inara e disse:
– Pois é, que pena que não deu certo, mas quem sabe um dia…
Próxima semana:
Capítulo 6 – TV Tupi, a primeira transmissão em cores da TV.
…
História inspirada em fatos reais, embora alguns eventos, personagens, nomes e locais, tenham sido criados para a composição literária. Qualquer semelhança com a realidade terá sido mera coincidência. YG
Otimo capitulo. Muito bom Inara. Quase deu certo. O importante e acreditar nos teus sonhos!!!!!
Também acho Maria Ines. Obrigada querida beijo grande.
Seguindo atentamente essa dwliciosa história…..
Ah querido Pericles, que delicia ter você acompanhando, beijo grande.
Boa leitura.
Boas recordações.
Bons tempos.
Adoro ler.
Obrigada Chris, beijos.
Querida Yara,
Estou adorando ler
Até a próxima
Um grande beijo
Sarita
Sarita obrigada querida.
Te espero na próxima semana, beijo enorme.
Nossa, já pensou se tivesse dado certo???? Quantas emoções, rsrs… aguardando os próximos
Parabéns, leitura muito gostosa
Obrigada Mazé, beijo grande.